Yoshihiro Tatsumi: Morre o autor de A Drifting Life

Morreu Yoshihiro Tatsumi, aos 79 anos, em Tóquio. Vida que fica mais chata e menos (belamente) soturna, com o ponto final na história do desenhista/escritor. Suas histórias foram confeccionadas como mangás, mas não pense o leitor de DG que estamos no território de Naruto. Yoshihiro sabia ser mais gótico que os Sisters of Mercy, enquanto humanamente profundo como os melhores dramas hollywoodianos dos anos 40, sua declarada maior influência. Foi responsável, entre outros, pela popularização do “gekiga”, mangá com temas adultos e de forte inspiração cinematográfica.

Yoshiriro Tatsumi começou a carreira desenhando e escrevendo de modo mais convencional – leia-se infantil -, mas, a partir de fins dos 50, suas histórias tomaram os contornos que o consagraria: técnica apurada e calcada nos enquadramentos da câmera de cinema; roteiros sobre o lado escuro de Tóquio e, principalmente, seus habitantes. Pense em “Trono Manchado de Sangue”, de Kurosawa. Carregue nas bruxas.

Publicado em inglês pela Drawn and Quarterly, e no Brasil pela Zarabatana, Tatsumi fez parte da revolução dos quadrinhos na virada dos anos 50 para 60. O gekiga japonês tinha como companheiros os maravilhosos quadrinhos alternativos que pipocaram entre países europeus, revelando gente como Moebius, Guido Crépax, René Goscinny. Nos EUA, os super heróis entrariam em formato menos estático (basicamente, a coisa era: têm poderes; combatem vilões com menos poderes) e se jogariam pelo cosmos, como a inolvidável série “New Gods”, de Jack Kirby, que, junto com Stan Lee, cautelosamente aderiram aos novos tempos. Quadrinhos gekiga estavam no meio de toda essa revolução lisérgico-visual, Yoshihiro Tatsumi firme na linha de frente.

O monumental “A Drifting Life”, de 2008, é considerada sua obra-prima. Catatau de mais de 800 páginas – que deslizam como se fossem 10 -, documenta autobiograficamente sua vida em Tóquio durante a segunda guerra mundial. Efeito similar às graphic novels de Harvey Pekar e Craig Thompson, com a diferença de ser desenhada anos após os acontecimentos e, portanto, impregnada de pátina enevoada típica de memorialistas que manjam as dificuldades de se confiar em lembranças. Compre, baixe ou roube agora.

Fabio Martins

Santista de nascimento, flamenguista de coração e paulistano por opção. Fã de cinema, música, HQ, games e cultura pop.

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