MPB | Cinco discos, quarenta anos

Hoje, a música se democratizou a ponto de estar pulverizada em incontáveis formatos e mídias. A cada dia fica mais difícil conseguir atrair a atenção do público. Por vezes, algum clip do YouTube se viraliza no facebook ou uma banda cativa um grupo de admiradores contando exclusivamente com a internet. Mas há quarenta anos as coisas eram bem diferentes

Em 1976, no meio de uma brutal e estúpida ditadura civil-militar, vários artistas continuavam a criar e gravar suas músicas. Driblando a censura e o monopólio da indústria do disco, muito do que se tornaria clássico no universo da MPB foi produzido. E, além do rádio e das apresentações ao vivo, o único meio de ouvir essas canções era o disco de vinil.

Em tempos de gravações análogas e de recursos técnicos limitados, o talento contava muito. Não havia programas para disfarçar vozes desafinadas ou corrigir notas fora da escala. A seguir, alguns desses trabalhos realizados em 1976 que sobreviveram ao tempo e se tornaram obras de interesse universal.

 

Estudando o Samba

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Entre os tropicalistas, Tom Zé pode ser o “menos” famoso, mas é com certeza a figura mais cult. Longe de abadás e afagos da mídia, acabou por criar uma obra diversa e inovadora, sem fazer concessões ao mercado fonográfico. Por isso acabou pagando, sendo ignorado pela mídia corporativa. Como o antecessor Todos os Olhos (1973), Estudando o samba passou em branco por público e crítica, sendo redescoberto por David Byrne que acabou levando o nome do músico para os EUA. Toc e Vai (Menina Amanhã de Manhã) são dois destaques em um disco forte por sua unidade.

 

Falso Brilhante

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Em 1974, Elis Regina havia gravado o clássico Elis & Tom, onde visitou o repertório do maestro Tom Jobim e fez a gravação definitiva de Águas de Março. Mas para o disco seguinte, retomou o hábito de lançar novos compositores, como havia feito com Milton NascimentoJoão Bosco e Aldir Blanc. Conhecido no Ceará, mas ainda em ascensão no sudeste, Belchior fornece dois grandes momentos de Falso BrilhanteComo Nossos Pais e Velha Roupa Colorida, em duas versões insuperáveis. De quebra, ainda temos Jardins de Infância, O Cavaleiro e os Moinhos, Fascinação e Tatuagem.

 

Meus Caros Amigos

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Durante a década de 70, Chico Buarque lapidou seu trabalho, atingindo aqui e em outras obras, um ponto de excelência. Herdeiro direto de Noel Rosa (embora se diga fã de Ismael Silva), Chico é um cronista moderno, fazendo de sua obra um raio-x da sociedade naquele momento. Sua facilidade de unir humor e ironia a versos de rara beleza não atrapalha a capacidade de transmitir um discurso político coerente, seja ele o feminismo ou a luta pela democracia e a volta (ou criação) do Estado de Direito. O Que Será? (À Flor da Terra), Mulheres de Atenas, Olhos nos Olhos, Passaredo e Meu Caro Amigo são clássicos, não só do repertório de Chico, mas da música brasileira.

 

África Brasil

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Quando entrou em estúdio para a gravação de África Brasil, Jorge Ben estava decidido a dar uma guinada em sua carreira. O violão, que até então era o seu instrumento, foi aposentado em favor da guitarra elétrica. Com a sua levada característica, agora unindo a música afro-brasileira e o soul negro estadunidense, Ben produziu um de seus trabalhos mais coesos. Além da regravação de Taj Mahal, o disco traz outros clássicos, com destaque para Ponta de Lança Africano (Umbabarauma), Camisa 10 da Gávea e Xica da Silva.

 

Cartola

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O disco homônimo que Cartola lançou em 1976, seu segundo gravado pelo mítico selo Marcus Pereira, é um de seus trabalhos mais celebrados entre fãs e críticos. No repertório, dois clássicos atemporais: As Rosas não Falam e O Mundo É um Moinho, duas canções que, mais tarde, fariam sucesso na voz de Beth Carvalho. Outras composições, como Minha, Sala de Recepção, Aconteceu, Sei Chorar, Cordas de Aço e Ensaboa ajudam a tornar esta obra obrigatória para quem gosta de música.

 

Bônus: Doces Bárbaros

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Em 1976,  Gil, Bethânia, Caetano e Gal já tinham algum tempo de estrada e, para comemorar o sucesso de suas carreiras individuais, resolveram criar uma espécie de supergrupo e rodar o Brasil com um show. A ideia de gravar um álbum e promovê-lo no palco foi abandonada em favor da ideia de gravarem um registro dos shows. Dessa maneira, apenas um compacto duplo com as canções Chuck Berry Fields Forver, São João Xangô Menino, Esotérico e O Seu Amor chegou às lojas. O disco lançado ao fim da turnê (que também rendeu um documentário), trazia outras 14 canções, entre elas Fé Cega, Faca  Amolada (Milton Nascimento e Ronaldo Bastos) e Um Índio (Caetano Veloso).

Fabio Martins

Santista de nascimento, flamenguista de coração e paulistano por opção. Fã de cinema, música, HQ, games e cultura pop.

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