18 Presentes mistura uma história real com ficção científica

A Netflix adquiriu recentemente os direitos do filme 18 Presentes, que acabou de entrar no catálogo brasileiro como um dos títulos fixos do serviço de streaming e logo já se alavancou para a lista das atrações mais assistidas na plataforma. A produção é um drama de origem italiana que se designa ser “baseado em fatos reais”, porém, como ele toma diversas licenças poéticas no decorrer do enredo, seria mais correto classificá-lo como “inspirado em uma história verdadeira”.

O filme é dirigido por Francesco Amado, mas seu roteiro foi criado em parceria com Alessio Vicenzotto, que realmente viveu alguns dos acontecimentos retratados em 18 Presentes. Tendo seu olhar como orientação, o filme explora uma temática que não é tão comum no cinema, a relação entre mãe e filha, sem aberturas para romances paralelos ou desenvolvimento de personagens secundários. Seu foco no relacionamento parental é preciso e segue firme até o final da trama.

Os verdadeiros Alessio e Elisa em seu casamento

Em 18 Presentes, acompanhamos a personagem Anna (interpretada por Benedetta Porcaroli, conhecida por protagonizar a série Baby), filha de Alessio Vicenzotto (Edoardo Leo) e Elisa Girotto (Vittoria Puccini), que acabou crescendo sem conhecer a própria mãe porque a mesma faleceu logo após o parto. Por conta disso, Anna tem sérios problemas com sua data de aniversário, por se tratar de um lembrete constante de que perdeu a mãe, o que faz com que se torne uma garota rebelde e imprudente, fazendo algumas péssimas escolhas no dia que mais detesta no ano (como ao insistir que uma colega de natação arrisque um salto perigoso e ao fugir de casa e pegar carona com um completo estranho que tem o dobro da sua idade).

A origem do nome escolhido para o longa vem da ideia que a verdadeira Elisa Girotto criou antes de morrer, como ela não teria a oportunidade de conhecer a filha por conta de um câncer de mama em estado avançado, resolveu fazer uma lista de presentes para que a menina recebesse até atingir a maioridade, podendo assim sentir que a mãe se fez presente na sua trajetória.

Entretanto, como cada presente é entregue à Anna sem nenhum contexto acerca deles explicando a intenção da mãe ao escolhê-los, a ideia acaba se tornando só uma decisão materialista sem um fundo sentimental, o que não ajuda a jovem a se sentir conectada com sua matriarca, e isso pode ser uma das justificativas para suas atitudes grosseiras. Nesse caso, foi necessário mudar as datas dos acontecimentos, pois a verdadeira Anna tem apenas três anos de idade atualmente, ou seja, as passagens que assistimos na adaptação são apenas fruto da imaginação do Vicenzotto da vida real sobre como pode vir a se desenrolar o crescimento e amadurecimento da garotinha.

Isso é um ponto que acaba sendo curioso se pararmos para pensar em como o pai pinta a filha, a falecida esposa e a si mesmo no filme. Anna é representada como uma adolescente insolente e irresponsável, enquanto Alessio aparenta ser um pai cuidadoso, empático e compreensivo, não há em momento algum uma amostra de comportamento questionável do personagem na trama, ele segue parecendo não possuir defeitos, ao contrário das protagonistas, uma vez que Elisa também toma certas decisões imprudentes, refletindo assim um pouco da personalidade da filha.

Será que esse pai quis se endeusar ao se descrever imaculado na história? Mas se ele é tão perfeito assim, por que a filha se tornou um furacão desenfreado de emoções problemáticas? Sem falar que se a Anna real ainda é uma criança e não teve tempo de desenvolver uma personalidade, o que será que ela achará quando atingir idade suficiente para assistir 18 Presentes e encarar a forma como seu pai a retratou? 

Fora essa reflexão, é importante dizer que há rumos surpreendentes que o filme toma e isso ocorre logo no início ao revelar um plot twist na trama. A personagem Anna sofre um atropelamento e é resgatada pela própria mãe, que também é a autora do acidente. Mas como isso pode acontecer se Elisa havia passado dessa para a melhor quando ela nasceu? Pois então, é por esse motivo que o filme deveria se intitular “inspirado” em fatos e não “baseado”, porque a partir desse momento a história adentra o gênero de ficção científica, proporcionando o encontro de mãe e filha em um plano irreal, que deixa em dúvida se realmente aconteceu ou foi apenas um sonho coletivo entre as duas personagens.

Quando elas despertam dessa realidade para suas próprias linhas de tempo, ambas ainda possuem lembranças iguais, mas as pessoas ao redor delas não viveram a mesma experiência. Esse desvio inesperado é o que dá o maior embalo em 18 Presentes, porém, ele também tem suas falhas, pois quando Anna finalmente conta para Elisa que é a filha dela que veio do futuro, a mulher aceita isso muito facilmente, sem grandes questionamentos.

As atuações são impecáveis, e vale ressaltar o empenho de Benedetta Porcaroli no papel da adolescente, porque mostra que a atriz consegue se desconectar de seus trabalhos anteriores e apresentar uma faceta totalmente nova. Em geral, o drama é muito bem elaborado e emocionante, misturando uma paleta de cores quentes, que trazem uma referência aconchegante ao clima de afeto, com uma atmosfera constante de melancolia pela ciência que as protagonistas possuem de seus próprios destinos trágicos.

Há uma metáfora com a morte e a redenção, pois no momento em que Anna e Elisa se encontram, a mãe estava dirigindo por um viaduto, logo após ter descoberto a doença, e esbarra com a filha no final dele, o que torna Anna a luz no fim do túnel, tanto como como o marco da morte de Elisa após o parto, quanto também como a iluminação de seus dias nesse sonho compartilhado.

https://www.youtube.com/watch?v=8vF9tMZrx6w

Luna Rocha

Redatora e podcaster, interessada por arte e cultura pop em suas mais diversas áreas. Curte adaptações literárias para o cinema, animes e cosplay.

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